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Exploração capitalista | Uber fez lobby com políticos enquanto lucrava com violência contra motoristas

Ao mesmo tempo que dizia que a violência a motoristas "vale a pena" para garantir o sucesso da empresa, a Uber destinou US$ 90 milhões a lobby no Congresso dos EUA e no Parlamento Europeu para superar leis fossem obstáculos para sua consolidação.

Mafê MacêdoPsicóloga e mestranda em Psicologia Social na UFMG

terça-feira 12 de julho de 2022 | Edição do dia

No último domingo (10), o jornal britânico The Guardian publicou uma uma reportagem que expõe diretores da Uber violando leis, incentivando violências contra motoristas e subornando diversos governos durante sua expansão global para passar por cima das legislações que proibiam o estabelecimento do formato de corridas por aplicativo.

Além disso, pelo menos 12 situações, os diretores da empresa ordenaram o setor de tecnologia a limparem imediatamente sua base de dados, que os comprometeria, ao serem comunicados sobre investigações contra a empresa.

Segundo os arquivos, a Uber também pagou centenas de milhares de dólares para acadêmicos para que produzissem pesquisas sobre os benefícios do modelo de negócios da Uber.

O jornal britânico teve acesso a arquivos referentes aos anos de 2013 a 2017 que expõem táticas utilizadas pela Uber em 40 países. Os documentos incluem mais de 83 mil emails e mensagens de texto entre o cofundador e então administrador da Uber, Travis Kalanick, e seus executivos.

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Os documentos citam políticos como o presidente dos Estados Unidos, Joe Biden, que enquanto vice de Barack Obama alterou seu discurso no Fórum Econômico de Davos em que defendeu a "liberdade de trabalhar quantas horas cada um quiser e gerir sua própria vida como desejar" elogiando a Uber depois de um encontro com Kalanick.

Pagando taxas baixíssimas e sem a garantia de nenhum direito, empresas como a Uber obrigam, no mundo todo, milhões de trabalhadores a fazerem dezenas de corridas por dia para garantirem uma renda miserável. Essas coorporativas, ao contrário do que Biden diz, não são uma forma de combate ao desemprego e nem representam nenhum tipo de liberdade.

Macron também ajudou a Uber a se consolidar na França na época em que era ministro da Economia, de 2014 a 2016. Em troca de mensagens com Kalanick, o presidente francês confirma cooperação na aprovação de leis favoráveis à empresa, mediando reuniões com instituições públicas e facilitando o acesso aos diretores da empresa.

Também aconteceram reuniões presenciais de lobistas da companhia com o primeiro-ministro irlandês, Enda kenny, o primeiro-ministro israelense, Benjamin Netanyahu, e o chanceler do Reino Unido, George Osborne.

O atual chanceler alemão, Olaf Scholz, na época prefeito de Hamburgo, foi chamado de "um verdadeiro comediante" quando negou as propostas dos lobistas da Uber e manteve seu posicionamento de que a empresa deveria pagar um salário mínimo aos motoristas cadastrados no aplicativo.

Em uma das conversas de 2016, Kalanick diz sobre a violência de taxistas contra motoristas da empresa: "Eu acho que vale a pena. Violência garante o sucesso". Fomentando essa "tática" a Uber avisava a imprensa: "Mantemos a narrativa da violência por alguns dias, antes de oferecer a solução".

No combate da tentativa dos capitalistas de colocarem trabalhadores contra trabalhadores, dividindo nossas forças de luta, o caminho para enfrentar a exploração extrema imposta por essas empresas é a auto-organização dos próprios motoristas, sem nenhuma confiança nos governos que negociam com essas empresas. Nesse sentido, acontecem diversas paralisações e protestos contra essas empresas, como o Breque dos Apps no Brasil ou o exemplo dos entregadores argentinos, que, em 2020, a partir do La Red de Precarizados junto com outras agrupações realizaram assembleias por região de trabalho e nacionalmente, discutindo as paralisações, as suas pautas e decidindo quem seriam os seus representantes em qualquer tipo de articulação que surgir sobre projetos de lei de parlamentares.

Com o desemprego, a precarização e a fome batendo recordes no Brasil como fruto do governo Bolsonaro e seus aliados, inimigos da classe trabalhadora e do povo oprimido, é urgente que a saída contra a carestia de vida e a miséria capitalista se dê através da exigência de que essas empresas garantam, como mínimo, todos os direitos previstos na CLT, salário mínimo digno e remuneração por todo o tempo em que os motoristas ficam aguardando com o app ligado. E também que dividam as entregas igualmente entre todos os entregadores disponíveis, sem necessidade da injusta pontuação, e pagando adicional por quilometragem.

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Essas demandas tem que fazer parte do combate ao desemprego como um todo, partindo da luta pela divisão das horas de trabalho entre todos os trabalhadores disponíveis e por um grande plano de obras públicas que possa empregar milhões de trabalhadores com direitos plenos, para que tenham a opção também de recorrer a outros empregos e não apenas a essas plataformas. A partir desse plano, deve-se batalhar por uma reforma urbana radical, que garantisse moradia, saneamento básico etc. Isso seria uma solução não apenas para o desemprego mas para outros milhares de problemas que afligem a população trabalhadora e pobre.

A auto-organização dos trabalhadores é imprescindível para que não sejam alguns poucos entregadores e parlamentares que discutam o que acham melhor ou pior para a categoria, mas sim que de fato levem a frente as reivindicações da base. Esse trabalho desde a base, no Brasil, é fundamental para organizar o movimento de motoristas de aplicativos, uma vez que, por aqui, a defesa de que estes trabalhadores sejam reconhecidos como CLT não é encampada por grande parte da categoria, exatamente pela forte a chantagem do governo Bolsonaro e das plataformas de que os entregadores têm que escolher “direitos ou empregos”, como se o fato de garantirem direitos fosse “falir” os aplicativos e fazer com que os trabalhadores fiquem sem renda, o que é uma grande mentira.

Essa chantagem, assim como a de que “vão sair do país caso os entregadores reivindiquem direitos”, é usada por empresas como a Uber em todo o mundo, e por isso a luta dos entregadores precisa ser também internacional. Afinal, se em todos os países estes se organizam para reivindicar direitos, não tem para onde os aplicativos correrem.

As eleições são um importante espaço que precisa ser usado pelos trabalhadores para fortalecer a organização de nossa classe. Mas não podemos cair a ilusão de achar que será possível acabar com a precarização e a exploração do trabalho apertando um botão na urna e apostando na conciliação de classes como faz o PSOL na federação com o Rede e o PT com a chapa Lula-Alckmin. O mesmo PT que, na contramão da ideia de que propiciou enormes avanços trabalhistas, em seus dois primeiros anos de governo já gerou um aumento de 127% dos terceirizados do Brasil. Ao longo do governo petista o número de terceirizados saltou de 4 milhões para 12,7 milhões em oito anos. Esses dados mostram o avanço da realidade da precarização do trabalho no Brasil. No caso das mulheres, a realidade é ainda mais gritante, pois correspondem a 70% do total dos trabalhadores terceirizados no país. Durante os governos de Lula e Dilma a CUT e a CTB pretenderam “regulamentar” as terceirizações, ou seja, manter sua existência, fundamental para os lucros capitalistas e a superexploração de milhões de trabalhadores.

Os trabalhadores da Uber e de empresas como ela realizam um serviço essencial para a população, precisam ser reconhecidos e ter condições dignas de trabalho. Contra a exploração capitalista, a demagogia de governos que colocam o lucro a cima das condições de vida da classe trabalhadora, desde o Esquerda Diário, queremos auxiliar nesta luta em todo mundo, apoiando iniciativas como a construção de uma rede de trabalhadores precarizados no Brasil, para que possamos mostrar que juntos somos mais fortes e fazer com que os capitalistas paguem pela crise.




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