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França | Universidade de Verão do Revolução Permanente reúne mais de 500 jovens e trabalhadores na França

Num ambiente particularmente combativo, 500 pessoas se reuniram na última quinta-feira no ato de abertura da Universidade de Verão do Révolution Permanente. Marcado pelo internacionalismo e pela solidariedade de classe, o evento foi um grande sucesso e é parte da discussão em vistas de conformar uma nova organização revolucionária de trabalhadores na França.

terça-feira 30 de agosto de 2022 | Edição do dia

Em um ambiente lotado, cerca de 500 pessoas se reuniram na quinta-feira à noite nos Alpes, na França, para abrir a Universidade de Verão do Révolution Permanente (RP), parte da mesma organização internacional à qual pertence o MRT no Brasil. O evento teve diversas mesas e plenárias de discussões sobre variados temas e foi uma oportunidade para preparar todos os militantes e simpatizantes para a nova situação internacional marcada pela reatualização das tendências de crises, guerras e revoluções, mas também para se prepararem para responder à ofensiva dos patrões após as férias de verão.

Compondo a mesa estava Elsa Marcel, advogada e militante do RP; Irène, estudante, militante do coletivo de juventude Levé Poing e do RP; Anasse Kazib, trabalhador ferroviário, ex-candidato às eleições presidenciais e porta-voz do RP; Gaétan Gracia, trabalhador da indústria aeronáutica em Toulouse, militante da CGT e do RP; assim como Giacomo e Tabéa, militantes da La Voce delle Lotte e da Klasse Gegen Klasse, respectivamente, seções italiana e alemã da Fração Trotskista.

Uma situação marcada pela reatualização da época de crises, guerras e revoluções

Abrindo o evento, foi realizada uma saudação aos camaradas da Argentina, do Estado Espanhol, da Itália, Suíça, Alemanha, Coreia do Sul, Argélia e Estados Unidos que foram participar desta primeira Universidade de Verão do Revolução Permanente. Também foi realizado um discurso em apoio a Jean-Marc Rouillan, antigo preso político que ainda é vítima da repressão estatal, e a Laurent, militante da central sindical Sud Rail, que foi demitida sob falso pretexto, após ter desempenhado papel ativo na greve da Transdev, empresa de transporte multinacional francesa.

Elsa Marcel abriu a noite dizendo que "Temos orgulho em receber tantas pessoas, trabalhadores de inúmeros setores, estudantes universitários e do ensino médio, após um ano do Révolution Permanente existir enquanto organização independente. Mais do que nunca, na sequência que nos espera, vamos precisar de uma organização revolucionária capaz de desempenhar um papel na luta de classes”.

Irène, estudante da Paris 8, iniciou sua fala dizendo que "o futuro que nos querem impor é um futuro de miséria, desemprego e precariedade. Um mundo onde a inflação está atingindo níveis recordes, onde teremos de escolher entre comer à noite ou pagar pela gasolina para ir trabalhar, um mundo onde a cada verão a crise climática se agrava, e com ela os incêndios e as secas, um mundo, enfim, onde as tensões imperialistas se intensificam, chegando até à guerra, inclusive. Isto porque os lucros de uns poucos ‘devem’ ser preservados à custa da vida de todos os outros”.

Tradução do tweet: Anasse Kazib começa falando da crise climática: “O GIEC [Grupo governamental de especialistas em evolução climática] nos dá 3 anos, e a gente sabe que a ecologia é contrária aos interesses capitalistas. Queremos por um fim nos voos em jatinhos privados, mas sobretudo, queremos acabar com a propriedade privada”.

Frente à catástrofe climática, social e econômica que já podemos sentir, a orientação do governo Macron é clara: fazer com que os trabalhadores e as classes populares paguem pela crise. Gaétan Gracia lembrou que "Macron explicou esta semana que ‘a guerra está à nossa porta’ e que teremos de ‘pagar o preço da nossa liberdade’. Alguns dias depois, usou o pretexto da crise climática e da guerra na Ucrânia para decretar o ’fim da época de despreocupação e abundância’. Claramente nenhum de nós aqui jamais conheceu uma vida despreocupada ou abundante, por isso o verdadeiro significado destas declarações é lembrar à gente que estas crises que eles próprios criaram terão de ser pagas por nós”.

Raiva na base: rumo a uma retomada da luta de classes a nível internacional?

Enquanto a crise econômica atinge duramente a classe trabalhadora, a atual situação de crise é particularmente contraditória e já está abrindo respostas no terreno da luta de classes. A nível internacional, nos últimos meses, as greves e lutas voltaram à linha da frente, por vezes com uma nova vivacidade. Anasse Kazib, trabalhador ferroviário, porta-voz do Révolution Permanente e ex pré candidato presidencial, comentou na mesa: "Se os Warren Buffet e outros grandes burgueses se sentem extasiados com a ideia de terem ganho a guerra entre as classes, eles não se esquecem de que cada uma das nossas explosões de indignação, cada uma das nossas mobilizações, nos permite preparar uma luta em uma escala infinitamente maior. Os seus sorrisos se transformam em baforadas de ansiedade quando, no Sri Lanka, os proletários tomam banho e dormem no quarto de um presidente deposto. Inversamente, cada mergulho na piscina de tal ex-presidente, cada sorriso dos nossos camaradas do Sri Lanka é fonte de grande orgulho e são uma pequena vitória para nós nesta guerra de classes. E os últimos anos nos ofereceram grandes emoções, quer do lado dos nossos camaradas no Hirak, na Argélia, nas mobilizações no Mali contra o imperialismo francês, nas revoltas em Myanmar, no Sudão, no Chile, nos Estados Unidos após o assassinato de George Floyd, ou na Palestina após os ataques do Xeque Jarah, quer na França durante os últimos cinco anos.

Não faltam motivos para se mobilizar. E também não falta raiva e descontentamento. Prova disso é a onda histórica de greves que está ocorrendo atualmente na Inglaterra. Gaetan abriu sua fala dizendo que "gostaria de levar toda a nossa solidariedade, em nome do Révolution Permanente, aos grevistas ferroviários, trabalhadores dos Correios, dos portos, da Amazon, etc., que nos recordam - apesar da sua dessincronização devido à estratégia das burocracias sindicais, e do esmagamento das greves por Thatcher há quase 40 anos - que a greve deve voltar a ser um instrumento central de luta contra a inflação".

Outro país, o mesmo sintoma: "A Alemanha dá frequentemente a impressão de ser um paraíso de paz social no coração do imperialismo europeu, e olhamos muitas vezes com um pouco de inveja para as enormes greves e lutas que se desenrolam na França. Contudo, no último ano e especialmente nos últimos meses, esta imagem de tranquilidade social tem sido gravemente afetada. Os trabalhadores hospitalares de Berlim e da Renânia entraram em greve contra um sistema de saúde falido, contra a terceirização e contra o fato de colocarem os lucros à frente das vidas humanas! Na quarta-feira, os trabalhadores do setor da saúde entraram em greve em Frankfurt. Os nossos camaradas da saúde têm feito campanha para que o movimento hospitalar em Berlim se oponha ao rearmamento frente à guerra na Ucrânia. E, nas últimas semanas, foram os estivadores que entraram em greve pela primeira vez em 40 anos! A sua palavra de ordem: ’Compensar a inflação é o mínimo’", concluiu Tabéa, que veio da Alemanha para a ocasião.

[Tradução tweet: Na Itália, ocorreram momentos importantes contra os capitalistas, como as ações dos portuários contra o tráfico de armas, com uma greve que levantou a consigna por "abaixo as armas, aumento salarial!" Giacomo, militante de La Vocce Delle Lotte]

A urgência de um plano de lutas e de uma resposta anti-imperialista e internacionalista

A situação poderia dar origem a um cocktail explosivo. Mas não será suficiente, por si só, para inverter o equilíbrio de poder. "Apesar de todas as emoções e fúrias que possamos sentir, sabemos que isto não é suficiente, que a espontaneidade e o radicalismo não são suficientes para mudar radicalmente as coisas. [...] Falta um programa, uma estratégia. Foi por isso que organizamos esse evento, para treinar as nossas mentes para lutar, para nos organizarmos, para nos prepararmos", apresenta Anasse Kazib. Tanto mais "a atmosfera de guerra torna-se cada vez mais presente, o racismo, a xenofobia e a presença da extrema-direita ficam cada vez mais fortes", acrescenta Gaétan.

[Tradução tweet: A nova geração operária mostrou que é capaz de levantar a cabeça e lutar. Cabe a nós fazer com que essa geração seja revolucionária]

Irène continuou: "Querem fazer de nós patriotas do imperialismo francês, deste imperialismo que saqueia a Argélia, que envia as suas tropas para controlar a África e vende as suas armas a ditaduras nos quatro cantos do mundo, e que hoje ’nos canta o refrão da guerra’. Temos o dever de recusar sermos controlados. Somos jovens sem pátria, uma juventude solidária com os jovens senegaleses que lutam contra as patronais das multinacionais de Bolloré, e que, ao contrário da esquerda institucional, não têm medo de dizer em alto e bom som, a Palestina viverá, a Palestina vencerá".

O evento afirmou que para o retorno pós verão europeu, será necessário estar presente em várias frentes. Enquanto as direções sindicais e a esquerda institucional se preparam, mais uma vez, para novos dias de mobilização sem perspectiva, "temos de romper com o rotineirismo da extrema esquerda, com as traições das direções sindicais e das organizações que se transformam em clubes de discussão. Os desafios que enfrentamos são imensos, e é coletivamente que seremos capazes de os ultrapassar", resumiu Anasse Kazib.

Frente aos trabalhadores há uma burguesia determinada a fazer o povo trabalhador pagar por suas crises. E está se preparando diariamente para as próximas explosões sociais. "Vamos ter de nos organizar para enfrentar o Estado capitalista, a sua polícia, o seu exército e os seus meios de comunicação; nos prepararmos diariamente num partido revolucionário dos trabalhadores, um partido sem ilusões quanto à esquerda institucional e que defende um programa revolucionário", disse Irène.

Em outras palavras, "a jovem geração militante deve se apropriar do pensamento revolucionário, estudá-lo seriamente. É assim que poderemos infundir esta tradição com toda a energia e paixão que caracteriza a juventude. É assim que iremos construir uma nova tradição revolucionária na França e que finalmente nos libertaremos das nossas correntes", concluiu Gaétan.

Um objetivo ambicioso. Tal ato ilustrou o brilhante sucesso da primeira Universidade de Verão do Revolução Permanente. Um sucesso e um momento forte que servirá de apoio à constituição de uma nova organização revolucionária na França. Enquanto muitos jovens, camaradas dos quatro cantos do mundo, bem como numerosas delegações de trabalhadores fizeram ressoar em alto e bom som as cores do internacionalismo, a parte mais difícil ainda está por vir: se preparar para estar à altura dos acontecimentos da luta de classes que não demorará muito a chegar, para - finalmente - tomar de novo a ofensiva.




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