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PRETO, PARDO OU MORENO?
Nem preto demais pra ser preto, nem branco demais pra ser branco. O que está por trás do termo pardo?
Lourival Aguiar Mahin
São Paulo
Jenifer Tristan
Estudante da UFABC

O Brasil é o maior país negro fora da África, 54% da população brasileira é negra, mas desses apenas 9% se declaram como negros e outros 45% se declaram pardos. No Brasil o critério para a definição é a auto-declaração mas ainda assim muitos negros não se reconhecem como tais, entenda porque:

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1) “Magina que você é negra, você não é negra!”

O receio, dúvida ou medo de muitas pessoas se declararem negras é um reflexo da ideia que perdura há séculos em nosso pais e que vê nos negros como algo ruim ou inferior ao branco. Assim ninguém quer ser associado a algo que a ideologia dominante vê, julga e trata todos os dias como algo inferior. Essa ideia é tão terrível que até mesmo os próprios negros muitas vezes não se veem como tal. Estas linhas foram escritas para que você negra ou negro que está lendo e fica na dúvida se é pardo ou moreno porque se acha preto demais para se dizer branco ou branco demais para se dizer negro, não tenha mais dúvida: o que te provoca medo e te impede de encher a boca com todo orgulho e dizer “sou negro” é uma coisa chamada RACISMO;

2) “Que isso você é linda, tem até traços mais finos!”

O racismo ganhou várias formas no mundo. Apesar do termo raça não ter nenhuma base científica, no Brasil, depois de teóricos tentarem provar “cientificamente” que os negros eram inferiores e por isso poderiam ser escravizados o racismo ganhou outras formas. A mais conhecida delas é um tipo de racismo que não se assume como tal e que chega inclusive a dizer que os negros foram importantes para o país pela sua dança, pela sua participação nos esportes, pela sua força e resistência físicas e pela “malemolência”. Ou seja, numa sociedade dominada de cabo a rabo pela burguesia branca dizem que os negros também tiveram o seu papel, para no fundo negar que o racismo exista. Este tipo de “racismo velado” foi defendido por Gilberto Freyre no seu livro Casa Grande e Senzala onde, entre outros absurdos, ele minimiza o estupro sofrido pelas escravizadas e as dores da escravidão, já que em sua visão houve uma relação de cordialidade entre escravizados e senhores, ou seja, apagando a brutal opressão sofrida pelo povo negro durante a escravidão;

3) “Você nem é tão escura e tem o cabelo bom, né?!”

Depois de trazer à força milhões de negros para serem escravizados no Brasil, o Estado brasileiro fez de tudo para apagar a identidade e o peso social dos negros em nosso país, não apenas perseguindo e reprimindo qualquer coisa que pudesse ser diretamente associada à origem negra, mas chegando ao ponto de que o governo estabelecesse metas de embranquecimento da população através da imigração e miscigenação da população que visavam o peso social dos negros em nosso país;

4) “Você é mais clara, não precisa falar que é negra!”

Essa noção (ou falta de noção) foi incorporada pelo “discurso oficial” brasileiro e, se somos um “povo” brasileiro, um país sem racismo, mestiço, somos também um país onde já não existiriam negros como tais, mas uma mistura que teria dado origem ao “povo brasileiro” de qual o melhor exemplo seria justamente a figura do “moreno”, da “mulata” ou, mais recentemente dos “pardos”.

5) "Não se declara negro não! Isso não vai te ajudar em nada aqui! Melhor dizer que é moreno"

Esses termos foram criados como parte da ideia de apagar a identidade negra de milhões de negros e negras de pele mais clara e, assim, manter viva a ideia de que no fundo se reivindicar negro é algo ruim ou inferior e entender que se declarar como “moreno" ou “pardo” é algo socialmente mais aceito;

6) “Tenho vários amigos negros, nem existe mais esse negócio de preconceito no Brasil.”

Uma das consequências mais profundas do mito da democracia racial (a ideia de que negros e brancos vivem em igualdade) é fazer com que milhões de negros não se enxerguem como tais. No Brasil, o país mais negro fora do continente africano, dos 54% da população considerada negra pelo Estado, somente 9% se auto-declaram negros e 45% como pardos.

7) “Esse negócio de capitalismo é coisa de branco, temos nada a ver com isso, se tá preocupada é branca também!”

Vivemos numa sociedade de classes, onde a burguesia explora e reprime a classe trabalhadora. Mas essa sociedade de classes se baseia também na opressão racial, no racismo. E a burguesia ganha ao fazer com que uma parte importante dos negros não se enxerguem assim, pois os trata como inferiores cotidianamente sem que seja explicitamente questionada pelo seu profundo racismo;

8) “Alisa, ou prende esse cabelo. Fica mais bonito!”

A burguesia, herdeira dos senhores de engenho em nosso país é quem mais quer apagar a identidade negra, pois sabe que quando um negro se dá conta de que não é pardo e sim negro sua vida muda completamente. Dá um passo em direção ao questionamento dessa sociedade miserável. Dá centenas de passos no sentido de ver cada uma das grandes revoltas contra a escravidão no Brasil e no Haiti, contra o colonialismo na África, como parte de nosso DNA e tradição. E se auto identificar negro e assumir suas características também é parte de se conectar com a história.

9) “Os negros é que se colocam em posição de vítimas, todos temos os mesmos direitos!”

E por que é importante dizer que não há racismo no Brasil? Talvez porque assim deixe de ter que explicar que a origem do racismo esteve profundamente ligada aos lucros capitalistas (através da escravidão) e ao fato de que mesmo após o término da escravidão o racismo é funcional ao capitalismo, pois permite que as mulheres negras ganhem 63% a menos que os homens brancos. E 77% dos assassinados pela polícia são negros, ou seja, a probabilidade de um jovem negro ser assassinado pela polícia é 3 vezes maior que de um jovem branco.

10) “Não sou ’pleta’! Sou ’molena’! Meu cabelo é enrolado, não é ruim!”

Desde muito cedo, a criança desenvolve a capacidade de enxergar as diferenças, em objetos, paisagens e principalmente entre pessoas. A relação de como a criança age frente às diferenças depende, nesse sentido, das mediações feitas pela família e pela escola.

A escola e a família, ao negar o racismo existente na sociedade e ensinar aos seus alunos e filhos que não se importem com essas práticas discriminatórias e preconceituosas, alegando que isso sempre aconteceu, negam à criança o direito em conhecer sua história de pertencimento social e cultural, as lutas e a resistência em ser negro no Brasil, e esses conhecimentos certamente irão ajudar a criança na construção de sua identidade social e nos conflitos que poderá enfrentar no decorrer de toda sua vida por ser negro no Brasil.

12) “ Os colegas não se adaptaram a ela!”

Quando não é dada a devida importância às diferenças, tanto na escola, como na família, as crianças buscam referências na sociedade. Nesta, por sua vez, alguns estereótipos são predominantes e criam imagens positivas ou negativas. A positiva sempre apresenta a criança ideal como branca, com cabelo liso, loiro e olhos claros, em diversos meios midiáticos vemos constantemente esse padrão dominante de beleza, e seu apreço pela sociedade. A negativa por sua vez, sempre está relacionada à pobreza, e em sua maioria apresenta-se uma criança negra, em condições miseráveis demonstrando sua fragilidade e sua inferioridade.

13) “Nossa negritude não cabe no seu capitalismo!!”

Por último, a todos que deram e darão um passo e começam a levantar os seus blacks e os seus dreads e, por todas as formas assumir a sua identidade negra contra o mito da democracia racial, é preciso perceber que o racismo é um fruto direto do capitalismo e, portanto, para podermos combater o racismo na sua raiz é preciso fazer isso como parte de um combate para destruir o capitalismo. Nesse combate, certamente os negros podem perceber que o capitalismo não tem mais a lhes oferecer do que mais opressão e exploração e assumir em suas mãos o questionamento profundo de toda sociedade em que vivemos através de uma revolução social que abra as portas e a possibilidade de construirmos uma nova sociedade livre do racismo e de toda forma de exploração e opressão.

 
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