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BONAPARTISMO
O reacionário artigo 142 e as disputas entre STF e militares pelo Poder Moderador
Yuri Capadócia

O desembarque no país dos ventos da explosiva luta internacional antirracista conseguiu ofuscar por um breve momento até a escalada de tensões autoritárias entre STF e militares. Entretanto, nesse final de semana novamente os dois principais blocos de poder em disputa voltaram a desembainhar seu arsenal autoritária um contra o outro. Dessa vez no centro da disputa o golpista artigo 142, suas interpretações e a quem cabe o papel de Poder Moderador do regime brasileiro.

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Mais uma vez se renovam as tendências de enfrentamentos autoritários opondo STF, em sua ofensiva contra Bolsonaro, e militares, em sua defesa do presidente. Diante de um avanço do judiciário, os militares do entorno presidencial elevam o tom golpista, em defesa do presidente, respondendo o autoritarismo do judiciário com a ameaça dos seus próprios métodos de força.

O centro da polêmica dessa vez esteve em torno do controverso artigo 142 da Constituição. Artigo que na reacionária interpretação dos militares lhes autoriza a tomarem o poder, em nome da garantia da lei e da ordem. Contra essa interpretação de “golpe constitucional”, o ministro Luiz Fux concedeu uma liminar fixando que as Forças Armadas não atuam como poder moderador em um eventual conflito entre os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. A resposta a decisão do ministro veio em rápida nota emitida na própria sexta-feira, assinada por Bolsonaro, Mourão e o general e ministro da Defesa Fernando Azevedo. Apesar da nota afirmar que “As FFAA do Brasil não cumprem ordens absurdas, como p. ex. a tomada de Poder”, traz na frase seguinte uma ameaça direta aos ministros em meio ao julgamento de cassação da chapa do TSE: “Também não aceitam tentativas de tomada de Poder por outro Poder da República, ao arrepio das Leis, ou por conta de julgamentos políticos”, afirma a nota. Essa narrativa de julgamento político também foi reforçada em entrevista dada por outro ministro militar palaciano, o general Ramos, que impôs como condição para que os militares não se atrevam ao golpe: “não estica a corda!”.

Muito mais do que a interpretação da letra da lei, o que está em jogo é a disputa pelo papel de poder moderador, quem pode se autointitular o árbitro do nosso regime. Não à toa nesse contexto de acirramento das disputas autoritárias entre STF e militares, surge a polêmica por essa interpretação. Esse artigo trata-se da última cartada das Forças Armadas para ameaçar os demais poderes e assegurar sua posição de árbitro do regime, como vemos as tropas bolsonaristas reivindicarem em seus atos, como Mourão já declarou ou como o general Villas Boas - à época comandante do Exército - já usou para ameaçar o STF durante o julgamento de Lula.

Porém mais do que uma interpretação golpista descabida como os demais setores do bonapartismo institucional apontam, esse artigo remete ao processo tutelado de elaboração da constituinte em que, para além dos conchavos e acordos da transição pactuada, os militares apelaram até para métodos de coerção, como cárcere privado, para inserir esse reacionário dispositivo. Como já recuperamos essa nebulosa história nesse artigo, a elaboração e redação desse texto não foi fortuita, mas foi fruto de uma das muitas interferências dos militares sob a Constituinte de 88, e é simbólica do legado reacionário que a dita Constituição Cidadã preservou desde as bases da Nova República.

Se os militares retornam com força a política, em um governo de extrema-direita flertando com projetos golpistas, é por se assentarem em toda uma herança ditatorial que não só passou intacta pela Constituição de 88, como foi preservada através de mecanismos como a Lei de Anistia. A degradação do regime que vimos a partir do golpe de 2016 alçou os militares novamente ao protagonismo político, trazendo em suas entranhas essa concepção golpista e ditatorial da qual nunca se separaram.

Porém, mesmo antes dos militares retomarem essa tradição do Poder Moderador, candidatos ao cargo não faltaram. Na conjuntura que levou ao golpe de 2016 e até as eleições de Bolsonaro, quem se arvorou como árbitro da política nacional foi o Judiciário, legitimando o golpe, prendendo Lula, atacando o direito ao sufrágio universal e manipulando as eleições em benefício do reacionário candidato da extrema-direita. Em palestra de 2014, e depois em várias entrevistas, o próprio ministro do STF, Dias Toffoli, aborda com bastante nitidez essas questões, ao afirmar que até 1985 o Exército cumpriu aquele papel de poder moderador, que teria herdado do império. E que o herdeiro desse papel do Exército seria o Judiciário, em especial o STF. Nas palavras de Toffoli: “O Supremo Tribunal Federal foi criado como herdeiro do poder moderador”. Apesar de ser o dito guardião da Constituição, nenhuma passagem da Carta Magna autoriza o STF a manobrar de forma tão arbitrária as normas constitucionais como vimos nos anos recentes, em que a Corte manipulou como quis a Constituição em benefício de seus interesses e para atacar a classe trabalhadora.

Entretanto, pela primeira vez assistimos a Cúpula das Forças Armadas e o STF, que até então caminhavam juntos em seu golpismo, em rota de colisão, cada qual com suas armas autoritárias, para saber quem detém o Poder Moderador nesse regime.

Esse choque autoritário entre os poderes escancara que vivemos uma crise do regime. Não basta a deposição de Bolsonaro, que resulta na ascensão definitiva de um governo militar, dominado por essa herança reacionária da Ditadura. É preciso gritar Fora Bolsonaro, Mourão e militares, buscando construir um pólo independente dos trabalhadores, que tampouco pode se apoiar no STF, em Maia, ou nos governadores. Por isso defendemos que seja o povo a decidir, levantando uma Assembleia Constituinte Livre e Soberana para impulsionar um programa classista que ofereça verdadeiramente uma saída não só para a crise política, econômica e sanitária, mas para essa crise reacionário do regime que vivemos.

 
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