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CORONAVÍRUS
Novas variantes do Coronavírus: testes e sequenciamento massivos já!
Gabriel Girão

Nas últimas semanas vimos notícias sobre novas variantes do coronavírus e seu potencial que assustam. Quais são as medidas necessárias para combatê-las?

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Nas últimas semanas os principais noticiários mundiais se voltaram sobre algumas novas variantes do novo coronavírus. Inicialmente, se deu muita ênfase na cepa inglesa (B.1.1.7), manauara (P.1) e a sul-africana (B.1.351). No entanto, nos últimos dias também saíram notícias sobre uma nova variante da Califórnia. Além disso, também temos que adicionar nessa lista a cepa carioca (P.2), que apesar de ter recebido menos atenção também é preocupante. Em comum, essas cepas têm mutações que são associadas a possibilidade de escape de imunidade e de uma maior capacidade de transmissão, além de estarem associadas a surtos fortes em seus locais de origem. Isso também levanta a possibilidade que na verdade existam muito mais variantes ainda desconhecidas ou pouco estudadas mas que também possuam características similares, como mostram estudos recentes no Japão, no Reino Unido e em Rondônia,

É importante frisar que essas novas variantes não “caíram do céu" ou são qualquer tipo de castigo divino, tampouco eram “imprevisíveis”. Há muito se sabe que vírus de RNA como os coronavírus são extremamente mutagênicos. Ainda que a maioria dessas mutações não sejam benéficas, algumas acabam sendo e, portanto, acabam prevalecendo sobre outras. Esse fenômeno, óbvio a partir de uma análise básica da teoria da evolução, é inclusive bem conhecido para outros coronavírus e para a gripe comum – sendo muitas vezes associados a fortes surtos epidêmicos.

No entanto, não podemos naturalizar esses fenômenos como meramente “naturais”. A verdade é que essas mutações no novo coronavírus se deram no contexto em que, à escala global, a pandemia está totalmente descontrolada. Com a exceção de um pequeno punhado de países, a verdade a principal medida de contenção não passou de quarentenas e lockdowns parciais em quase todos os países do globo, desde semicoloniais com negacionistas à frente como o nosso, até países imperialistas com governos supostamente progressistas como o Estado espanhol. Mesmo após quase um ano de pandemia, não se organizou nenhum plano sério de combate à pandemia, com testagem massiva e quarentenas racionais, apenas se limitaram a medidas muito parciais até “chegar a vacina”. O resultado disso é que o vírus não apenas encontrou espaço para circular livremente, como também para evoluir e se adaptar livremente, resultando na calamidade que assistimos ao vivo.

Tampouco a catástrofe que vimos em Manaus pode ser atribuída meramente à capacidade biológica do vírus. Além da falta de testes, o governo recuou em medidas de isolamento após protestos de empresários; o período de fim de ano também coincidiu com o fim do auxílio emergencial e aumento das pessoas indo à rua para trabalhar (ou tentar arranjar um emprego); e, para finalizar, mesmo a precária estrutura de saúde montada durante a primeira onda tinha sido desmontada, de forma que o sistema de saúde rapidamente colapsou gerando inúmeras mortes que poderiam ter sido evitadas com atendimento médico-hospitalar adequado. Essa situação não foi específica de Manaus e também pode ser observada em outros lugares como no Rio de Janeiro.

Não satisfeitos em não ter nenhuma medida séria de combate à pandemia, a maioria dos países não se deu nem o trabalho de organizar uma vigilância genômica eficiente, para saber quais são as variantes circulantes e qual sua incidência na população. Evidentemente, não se trata de menosprezar os esforços feitos por cientistas e grupos de pesquisa no mundo todo que trabalham com o tema, mas sem uma política de Estado nesse sentido (que não há em quase nenhuma lugar do mundo), tais esforços – que poderiam ser muito úteis no combate à pandemia – acabam ficando impotentes.

Frente ao surgimento de novas variantes, a principal resposta dos governos foi de simplesmente suspender voos. Tal medida isolada é totalmente impotente, como mostra o fato de que a nova variante inglesa já foi encontrada em mais de 70 países. Além disso, um estudo recente mostra que ela já estava circulando nos EUA em novembro, um mês antes de ser identificada no Reino Unido (que descobriu que ela já circulava desde setembro no país).

No Brasil a situação é tão crítica que a variante P.1 só foi descoberta depois que viajantes japoneses chegaram ao seu país de origem infectados.. Apenas 3 laboratórios estão realizando o sequenciamento, a Fiocruz, o Adolfo Lutz, e o Instituto Evandro Chagas (IEC) e estes sofrem com falta de insumos, de forma que apenas 0,03% dos genomas são sequenciados

Enquanto Bolsonaro e seu negacionismo falavam em gripezinha e se colocava abertamente contra qualquer medida de combate à pandemia e inclusive ignorou todos os alertas sobre a falta de oxigênio em Manaus, Dória, os Governadores e o STF posavam de racionais e agora vem fazendo demagogia com o vacina. No entanto, após mais de um mês da primeira vacina receber o aval da Anvisa, a primeira dose da vacina só foi aplicada a menos de 3% da população. Enquanto isso, mesmo que a nova cepa P.1 tenha sido descoberta em dezembro, quase 2 meses depois, nada fizeram para avançar num sistema de vigilância genômica para localizar e impedir a disseminação de novas cepas. Com isso, repetem o mesmo comportamento que tiveram desde o início da pandemia, onde apesar de posarem de “racionais” não tomaram nenhuma medida realmente eficaz como a testagem em massa. Na verdade, vão exatamente no caminho contrário, querendo reabrir as escolas sem nenhuma segurança sanitária e passando por cima de mobilizações de professores em diversos estados. Agora, a nova medida sanitária adotada por governadores e prefeitos tem sido o toque de recolher noturno. Tal medida, além de remontar a ditaduras, terá pouco efeito sanitário visto que durante o dia a ausência de testes persiste e toda a economia continua aberta e os transportes públicos lotados, e ainda não há nenhuma evidência científica de variantes do vírus que só contaminem no período noturno. Dessa forma mostram que apesar da diferença retórica com o presidente, seu principal compromisso não é com a população e sim com o lucro dos grandes capitalistas.

O surgimento dessas novas variantes pode mudar a forma que pensávamos sobre a pandemia em muitos aspectos. Inclusive, a hipótese que alguns lugares teriam atingido a imunidade de rebanho – hipótese que esteve muito em voga em meados do ano passado baseado no fato que muitos locais não viam aumento de casos mesmo abrindo tudo - agora com essas novas variantes pode até mudar radicalmente a forma como entendemos o próprio conceito de imunidade de rebanho, como mostra bem o exemplo de Manaus). Até mesmo a eficácia das vacinações pode estar em risco.

Evidentemente, algumas perguntas ainda estão a ser respondidas: Qual será o impacto dessas novas variantes ao se disseminarem por outros lugares? Qual será o impacto dessas novas variantes na vacinação? Quantas variantes com adaptações como as recém descobertas existem de fato e qual é seu impacto em fortes surtos? A longo prazo, qual será a capacidade do coronavírus de seguir produzindo novas variantes que consigam fugir da imunidade e como isso prolongará a duração da pandemia?

Não temos aqui a capacidade de responder essas perguntas e, portanto, de fechar nenhum prognóstico. Mas nós simplesmente não podemos ficar às cegas sobre as variantes circulando, como estamos hoje.

Por tudo que foi colocado, é urgente uma política de vigilância genômica, organizada por trabalhadores da saúde, pesquisadores e cientistas, que busque descobrir quais são as cepas de SARS-CoV2 circulando no país e suas especificidades, assim como a incidência regional de cada uma delas. Apenas assim poderemos ter um quadro completo da situação e traçar estratégias rápidas para lidar com essas novas variantes (como por exemplo a atualização de vacinas e de medidas certeiras que possam evitar a disseminação de variantes com maior potencial de infecção ou com escape de imunidade).

Longe de ser algo complexo, a vigilância genômica já é realizada de forma incipiente por instituições como a FioCruz, além de alguns grupos de pesquisa, mostrando como já existem cientistas qualificados e técnicas conhecidas para realizar tal procedimento. A própria instituição acaba de desenvolver um teste de PCR que consegue identificar algumas dessas novas variantes descobertas, o que possibilita simplificar a análise da incidência das diferentes cepas circulantes. Cabe dizer que quando o primeiro caso de Covid diagnosticado no Brasil, teve seu genoma sequenciado em 48 horas.

Junto a isso, também é necessário uma política de combate à pandemia que envolva um plano de testagem massiva que consiga rastrear e isolar os infectados e assim cortar a transmissão - algo também muito importante para sabermos quais são as variantes circulando no país, assim como um plano de emergência no SUS, garantindo leitos, oxigênio e respiradores a todos que necessitam e evitar futuros colapsos no sistema de saúde.

Com quase um ano de pandemia já tivemos avanços técnico-científicos que não apenas baratearam como aumentaram o número de “armas” que temos contra o vírus, como por exemplo o desenvolvimento de testes de antígenos (que permitem detectar a infecção desde seu início e disponibilizam o resultado em minutos) ou testes RT-LAMP, além de respiradores.

No entanto, mesmo com todo com esses avanços técnicos e com toda a disponibilidade de recursos técnicos e humano para fazer a vigilância genômica, a burguesia não deu nenhuma uma resposta séria à crise sanitária e nem ao menos montou um sistema eficiente de vigilância genômica, tanto na sua faceta negacionista com Bolsonaro ou na sua faceta supostamente “racional” de Dória e dos governadores, como mostra o atual estado que nos encontramos. Isso só prova o que dissemos acima, que ambos os setores não se preocupam nem um pouco com a vida dos trabalhadores e estão apenas preocupados em preservar o lucro dos grandes empresários. Por isso, apenas a mobilização e a organização da classe trabalhadora podem dar uma resposta à crise.

Ver também: Por um plano de guerra organizado por operários para combater o coronavírus

Com as novas variantes, as grandes indústrias farmacêuticas já anunciaram que vão trabalhar para atualizar suas vacinas às novas variantes. No entanto, cada empresa fará isso de forma individual visando o seu lucro, com seus estudos em segredo e em competição umas com as outras e depois ditarão o preço e a distribuição das novas vacinas. Imagina, se ao invés disso, tivéssemos um esforço conjunto entre a comunidade científica global para garantir o mais rápido possível a atualização das vacinas, assim como sua distribuição universal? Evidentemente seria muito mais eficiente e salvaria muito mais vidas. No entanto, na lógica atual do capitalismo impede isso. Por isso é urgente lutar pela anulação de patentes, a publicização dos estudos e a estatização das indústrias farmacêuticas sob controle operário. Essa é a forma mais eficiente de garantir a agilidade e confiabilidade na produção de vacinas contra as novas variantes, além de sua distribuição rápida e universal. A mesma lógica também poderia ser usada para a pesquisa e a produção de tratamentos eficientes para a covid.

 
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