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COLUNA
A LSN, o legado da ditadura e a necessidade de uma Constituinte Livre e Soberana
Douglas Silva
Professor de Sociologia
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No último período, durante os dois primeiros anos do governo Bolsonaro, assistimos ao aumento da utilização de um dos legados diretos da ditadura militar brasileira: a Lei de Segurança Nacional (LSN). Os procedimentos abertos pela Polícia Federal para, supostamente, apurar crimes contra a “segurança nacional” aumentaram 285%. Todavia, a utilização da LSN não é novidade durante o governo reacionário do capitão. Ainda que ganhe maior protagonismo durante o mesmo, a lei foi responsável por 20 inquéritos entre 2015 e 2016, ou seja, durante o governo Dilma (PT) e, com o golpe institucional, com o golpista Michel Temer (MDB). A chegada de Bolsonaro levou, entre 2019 e 2020, um salto do número de inquéritos para 77.

A LSN foi redigida durante a ditadura militar (1964-1985), anterior a própria Constituição de 1988 e sobrevivendo a mesma, sendo promulgada no período final da ditadura (1983), redação que segue até os dias atuais. Entretanto, a utilização do artifício chegou a levar setores da própria esquerda brasileira a se entusiasmar pela aplicação de tal lei, como se pudéssemos esperar qualquer resposta pela esquerda e que represente uma alternativa para os trabalhadores por meio de um legado que, outrora, representou perseguições e mortes da oposição ao regime militar.

A lógica que oferece sustentação à LSN tem embasamento teórico na Doutrina de Segurança Nacional, que permeou os governos militares brasileiros inspirados na doutrina de segurança dos EUA durante a Guerra Fria e perfurou as escolas militares do nosso país. Todavia, tal lógica, posteriormente, viria a sustentar que os novos inimigos, após o fim da URSS, seriam internos, ou seja, opositores dos governos em exercício. O aumento de inquéritos sob o governo Bolsonaro parece, inclusive, em consonância com seu discurso de “guerra cultural” e a defesa de que possa continuar atuando como figura abominável no combate a pandemia, e, nesse caso, não sozinho, mas acompanhado por diversos atores golpistas, como STF e governadores, os quais, em grande medida, tentam desvencilhar-se do apoio que deram à onda bolsonarista.

Recentemente a prisão de Daniel Silveira (PSL-RJ), figura bolsonarista execrável, foi alvo de um inquérito baseado na LSN pela decisão do ministro Alexandre de Moraes, do STF. Embora a prisão de um bolsonarista tenha causado certo entusiasmo nos setores mais progressistas, a verdade é que a utilização de mecanismos tão reacionários, como a presente lei, carrega na conta muito mais ataques aos trabalhadores do que a extrema direita, coisa que, inclusive, o STF foi responsável inúmeras vezes, como durante as manifestações de junho de 2013, em que, junto a lei antiterrorismo aprovada por Dilma, jovens manifestantes tiveram suas prisões embasadas no legado da ditadura.

Ontem mesmo, quinta-feira (18), a PM embasou a prisão de cinco manifestantes na LSN. A lei estabelece como crime, em seu artigo 26: “Caluniar ou difamar o Presidente da República, o do Senado Federal, o da Câmara dos Deputados ou o do Supremo Tribunal Federal, imputando-lhes fato definido como crime ou fato ofensivo à reputação. Pena: reclusão, de 1 a 4 anos.” Portanto, foi em base a isso que a PM prendeu os manifestantes que carregavam uma faixa com a frase “Bolsonaro Genocida”, em frente ao Palácio do Planalto, no momento em que a pandemia atinge o estágio mais grave do que no início do ano passado e tem na figura do presidente seu representante mais negacionista, ainda que busque manobrar seu discurso com a volta de Lula ao páreo.

Os dois exemplos, para trazermos apenas dois, são expressão de como os diversos atores golpistas e reacionários se utilizam de um legado autoritário para sustentar prisões e perseguições. Ainda que algumas se apresentem como combate a “fake news” ou “defesa dos membros da Corte”, a verdade é que seu histórico só permite vislumbrar a possibilidade da mesma se voltar contra a esquerda e o conjunto da classe trabalhadora quando se enfrentarem não apenas com Bolsonaro, mas com todo o regime do golpe, no qual não podemos depositar nenhuma confiança.

Portanto, se enfrentar com o regime golpista e seus diversos atores, incluindo aqueles que tentam se alçar como garantidores da democracia depois de todo apoio oferecido ao golpe institucional e seus ataques econômicos, passa por combater, também, medidas autoritárias que – cedo ou tarde – podem se voltar contra o conjunto de nossa classe. Por isso, lutar por uma Assembleia Constituinte, que seja verdadeiramente Livre e Soberana, diferente da Constituição de 1988, com a qual se garantiu anistia aos militares e permitiu a manutenção de um legado direto da ditadura sobre a transição pactuada, por exemplo, se faz tão necessário e tarefa de primeira ordem para o conjunto da esquerda brasileira.

Somente por meio de tal consigna poderemos combater as instituições de uma “democracia golpista”, sem depositar nossas forças num impeachment que, em última instância, levaria ao governo, Mourão, outro militar representante do legado autoritário da ditadura e do regime do golpe. Mas, nesse sentido, também é necessário reconhecer que não podemos esperar 2022, para colocar de pé uma resposta ao agravamento da crise econômica, social e pandêmica, como defende Lula com, inclusive, a possibilidade de uma Frente Ampla com representantes golpistas que não possuem nenhum interesse em anular as reformas, privatizações e todos os ataques que foram sustentados pelo golpe institucional. Contra tal regime, apenas uma Constituinte Livre e Soberana, levantada pela luta das massas, poderá varrer para a lata de lixo da história os parasitas das mais diversas instituições representantes dos interesses exclusivos da burguesia.

 
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