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Meio Ambiente
A crise energética na Europa escancara a eco-demagogia capitalista
Caio Reis

A guerra na Ucrânia e as sanções e boicotes decorrentes abalaram o fornecimento energético europeu e engendraram uma nova crise mundial nos combustíveis. Em meio a novas catástrofes climáticas, os imperialismos europeus e suas multinacionais buscam “soberania energética” com mais políticas poluentes e projetos de expansão para o continente africano e asiático.

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Comissão Europeia anunciando o plano de corte de 15% na distribuição de gás "Guarde gás para um inverno seguro". 20 de julho de 2022. [Lukasz Kobus / Comissão Europeia]

Na contramão do discurso de “transição verde” assumido pelas potências capitalistas na sequência da COP26, no ano passado, a crise de fornecimento energético na Europa, aberta pelas consequências da guerra na Ucrânia, deu novos ares às políticas poluentes e aos lucros e ambições das indústrias multinacionais do ramo energético. Se o verão atual foi marcado por ondas de calor inéditas, secas e incêndios nos países do hemisfério norte, rumo ao inverno e sem o importante gás russo, os países europeus incrementam a queima de carvão, planejam novos terminais para importar gás natural e a expansão de gasodutos.

Recém acompanhamos uma onda de calor devastadora que atingiu a Europa e o conjunto dos países costeiros do mediterrâneo, acompanhada por secas e incêndios que anunciam um futuro de extremos climáticos na região. Uma catástrofe produzida pelo modo de produção capitalista e que se funde com a inflação dos alimentos, das tarifas de energia e a sombra da guerra, ameaçando principalmente a classe trabalhadora, a juventude, os refugiados e as parcelas mais oprimidas e empobrecidas da população mundial.

Se, diante da crise econômica, aumentam o custo de vida para manterem os lucros em cima de nossas costas com a inflação - o que nossa classe lá no norte vem respondendo com uma exemplar onda de greves - na crise climática, querem socializar a responsabilidade enquanto continuam embolsando bilhões. Mas não nos enganemos: os capitalistas são os maiores culpados. Um dos muitos relatórios que diretamente mostram isso é o publicado em 2017 pela ONG Carbon Disclosure Project: 100 empresas são responsáveis por 71% das emissões mundiais de gases de efeito estufa, principalmente as do ramo energético.

A guerra e a crise energética

Antes da guerra, a Rússia fornecia 40% do gás utilizado para aquecimento e produção de energia na Europa. Agora, com a guerra, ao passo que a União Europeia impõe sanções e a Rússia responde cortando o fornecimento de gás, os países da UE buscam diversificar o fornecimento e diminuir a dependência com o país de Putin. Há uma poluente corrida contra o tempo, antes da chegada do inverno, e que vem gerando atritos no interior da própria UE, à medida que os países do bloco disputam pelos recursos energéticos disponíveis.

O custo da energia vem atacando diretamente a classe trabalhadora e a população pobre desses países. Na França, os preços do gás, gasolina e energia já subiram em média 33% de julho de 2021 para julho de 2022. Não só os domicílios, como também a indústria europeia de conjunto já vê a possibilidade concreta de grandes dificuldades de fornecimento para o inverno de 2022-2023.

A resposta imediata de governos que não há muito levantavam (demagogicamente) a bandeira da ecologia e da transição verde, como Olaf Scholz na Alemanha, Macron na França e Pedro Sánchez na Espanha, vem sendo a autorização do incremento das emissões, com a ativação de termelétricas movidas a carvão, a construção de novos terminais para importação de gás, bem como a construção de novos gasodutos faraônicos e projetos de exploração na África e Oriente Médio. Evidentemente, quem vem em grande medida lucrando com a guerra e os problemas para a classe trabalhadora internacional que a acompanham, como a alta dos preços, são os capitalistas e suas multinacionais.

Os capitalistas soltam o freio dos projetos poluentes e imperialistas

Desde março, a nova “diplomacia do gás” europeia busca alternativas para substituir as importações da Rússia. No continente asiático, duas propostas são o possível duto submarino Israel-Turquia-Europa e a expansão do Gasoduto Trans-Anatoliano, um mega-projeto que ligaria o Mar Cáspio e a Europa também através da Turquia. Mais ao sul, outra alternativa renovada vem sendo a África.

Como escreveu Phillipe Alcoy ao RP Dimanche, parte da rede internacional da qual o Esquerda Diário e o Ideias de Esquerda fazem parte, renova-se o apetite imperialista pela África. Autoridades estatais e representantes de multinacionais privadas europeias e norte-americanas do ramo energético se dirigem ao continente africano em busca de acordos comerciais e para instalar lá suas operações - um processo não tão simples, visto que Rússia e China já vinham desenvolvendo relações no continente e muitos países africanos mantém uma posição de “neutralidade” nas atuais disputas internacionais.

Em seu artigo, ele relata que dois projetos faraônicos vêm sendo desenhados no mapa do continente africano. O primeiro, o Gasoduto Trans-Saariano, atravessa o deserto, ligando Nigéria, Níger e Argélia por 4.128 km de dutos, e então vai para a Europa através de Espanha ou Itália. O segundo é um gasoduto submarino que ligaria os países africanos da costa atlântica com o Marrocos e então com a Espanha. Ambos, como os projetos orientais, vêm sendo questionados quanto à segurança das zonas que atravessam, permeadas por instabilidades políticas profundas e que, como escreve Phillipe, se aprofundam pelas políticas imperialistas:

”A reativação de conflitos regionais congelados ou o surgimento de novos conflitos é resultado das consequências dessa aceleração da política da UE de busca de novos fornecedores de gás e petróleo. Outra consequência provável será uma política mais agressiva das potências imperialistas europeias na África, onde vão querer mais do que nunca instalar governos alinhados e totalmente dóceis.”

Nesse sentido, a corrida imperialista pela exploração do gás não só pode resultar em novas catástrofes ambientais e climáticas, como também beneficiar regimes políticos reacionários repressivos, contrários aos interesses das massas trabalhadoras dos continentes africano e asiático.

É urgente se enfrentar com a irracionalidade capitalista

Enquanto o 1% mais rico enriquece na casa dos trilhões com as consequências da crise, da pandemia e da guerra, emitindo metade dos gases de efeito estufa globais, nós, os 50% mais pobres, emitimos apenas 10% e somos as vítimas exclusivas da fome, do desemprego, da pandemia, da guerra e das catástrofes climáticas e ambientais.

Primeiramente, é preciso declarar guerra à guerra na Ucrânia, contra a intervenção militar reacionária de Putin, mas também frontalmente contra o militarismo da OTAN, que usa a Ucrânia como bucha de canhão para suas próprias ambições expansionistas. Contra as sanções e pelo surgimento de uma saída política independente com classe trabalhadora na frente, no caminho das mobilizações e paralisações contra a guerra que já ocorreram na Europa.

A classe trabalhadora é a que move o mundo todos os dias, enquanto os capitalistas tomam as decisões e acumulam os lucros. Se retirássemos esses lucros da equação, não teríamos motivo para seguir apostando em uma matriz energética fóssil mundialmente. Por isso, a aliança do conjunto dos trabalhadores com os povos originários, os movimentos ambientalistas, a juventude e todos os oprimidos é que pode apresentar um projeto de sociedade realmente sustentável para reverter as mudanças climáticas e a crise ambiental.

Precisamos tomar como exemplo a greve dos petroleiros de Grandpuits na França, que denunciaram o greenwashing da multinacional TotalEnergies, se organizaram em comitês de greve - passando por cima da burocracia sindical - e se aliaram com o movimento ecológico em defesa dos empregos, dos salários e de uma verdadeira reconversão industrial ecológica.

A luta contra o ecocídio capitalista não virá dos mesmos empresários, acionistas e líderes de Estados burgueses que nos trouxeram até aqui. Em cada país, ela precisa levantar a nacionalização integral de toda a indústria energética sob gestão de seus próprios trabalhadores, com profissionais e especialistas das universidades públicas e ao lado das comunidades afetadas pelas operações. Só assim é possível planificar uma transição energética verdadeiramente justa, radicalmente democrática, que garanta o fornecimento energético, gere novos empregos e supere as técnicas destrutivas, no caminho de uma economia planificada socialista: a única possivelmente harmônica com o planeta.

 
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