×

Editorial MRT | As greves na educação mostram o caminho: abaixo o ajuste fiscal, o PL da Uberização e o NEM

Na última semana, teve início a greve dos trabalhadores técnico-administrativos de 60 universidades federais, que lutam contra a defasagem salarial, a precarização das condições de ensino e contra o arrocho salarial do governo da Frente Ampla Lula-Alckmin. A partir do dia 03, começa a greve nos institutos federais. A educação básica colocou dez mil servidores municipais de São Paulo nas ruas nesta terça-feira (19), impulsionados pela greve dos educadores municipais e que encontra eco na greve de educadores de Contagem (MG), Uberlândia (MG) e Salvador (BA). Milhares de trabalhadores começam a cruzar os braços para não seguir aceitando pagar as contas da crise econômica com seus salários, o que também é consequência do ajuste fiscal de Haddad, ao passo que o governo traz um novo ataque de precarização inédita: o PL da Uberização.

Marie CastañedaEstudante de Ciências Sociais na UFRN

Grazi RodriguesProfessora da rede municipal de São Paulo

quinta-feira 21 de março | Edição do dia

A mídia burguesa tenta a todo custo calar a greve dos técnicos administrativos das universidades federais, que com extensão nacional, já paralisa mais de 60 universidades em todo o país. Estes trabalhadores se enfrentam contra a defasagem salarial, que desde 2015 acumula uma perda de 34%. Neste ano, o governo da Frente Ampla Lula-Alckmin, como parte dos impactos do ajuste fiscal levado adiante por Haddad por meio do Arcabouço Fiscal, propôs um aumento de 9%, dividido entre 2025 e 2026, uma afronta que contrasta com o aumento garantido para a Polícia Rodoviária Federal, que recebeu um aumento de 48%. Ou seja, a polícia que assassinou Genivaldo em uma câmara de gás improvisada e assassina da juventude negra recebe aumento e os trabalhadores da educação amargam arrocho. Este cenário nas universidades federais se combina com os gritantes resultados dos cortes que começaram com Dilma Rousseff, se aprofundaram com Michel Temer e Bolsonaro e seguem com Lula-Alckmin na educação, em um valor total estimado de R$ 8 bilhões, resultando em uma crise orçamentária histórica nas federais, pauta que também se expressa na greve dos servidores, defendendo a recomposição de orçamentos, mais concursos públicos, entre outras demandas. Também pagam por essa crise os e as trabalhadoras terceirizadas, os cotistas e bolsistas, que precisam apoiar a greve dos técnicos. Além disso, faltam professores, falta permanência estudantil e a partir do dia 03 de abril, entram em greve também os técnico-administrativos dos institutos federais, com as mesmas pautas e começam a ser anunciados indicativos de greve também para docentes.

Esta luta nacional pela educação se combina com greves municipais. Em São Paulo, as trabalhadoras da educação começaram sua greve no dia 08 de março e na última terça-feira (19) tomaram as ruas em torno de 10 mil manifestantes junto a demais categorias do funcionalismo paulista. Os agentes de saúde tiveram destaque se somando à manifestação, inclusive os de controle da dengue, em um cenário no qual a cidade de São Paulo está em estado de emergência, junto dos engenheiros, da vigilância sanitária, dos trabalhadores da saúde do Hospital do Servidor Municipal, em uma forte demonstração debaixo de chuva, demonstrando sua disposição de luta. Esta greve se enfrenta com o reajuste de fome proposto pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), candidato do bolsonarismo e inimigo das mulheres, que ao lado de Tarcísio de Freitas quer destruir a educação. Enquanto apresenta como reajuste aos educadores apenas 2,16%, este garantiu o próprio aumento em 46% em 2022, por meio do SAMPAPREV, roubou 14% da aposentadoria dos servidores e arrancou abonos. Os agentes de saúde em greve denunciam a total ausência de equipamentos adequados em meio ao estado de emergência pela dengue na maior capital do país.

Em Minas Gerais, os educadores do município de Contagem estão em greve desde o dia 15, também contra a falta de reajuste salarial, fechamento de turmas e pelo preenchimento das vagas ociosas de professores nas unidades que o governo de Marília Campos (PT) se nega a garantir. Na semana passada, os educadores de MG também paralisaram suas atividades por 48h, denunciando que o governo estadual de Zema (Partido Novo) havia transformado o piso salarial em teto salarial. No caso dos educadores municipais de Uberlândia, a justiça declarou a greve ilegal aplicando uma multa no valor de R$ 200 mil por dia, demonstrando novamente seu caráter de classe, como inimiga da classe trabalhadora ao não reconhecer o direito constitucional de greve. Em Salvador, os educadores municipais estão protagonizando 72 horas de paralisação, se enfrentando com o prefeito bolsonarista Bruno Reis (União Brasil), que queria fazer com que os educadores engolissem um reajuste de 3,62%, ao que respondem exigindo o pagamento do piso salarial. Em Florianópolis os servidores fizeram uma forte greve de oito dias, encerrada na quarta (20), após a justiça e a prefeitura do PSD perseguirem os trabalhadores, multarem o sindicato e colocarem a greve na ilegalidade.

A greve dos servidores das universidades e institutos federais se enfrenta diretamente com as consequências do Arcabouço Fiscal, o novo teto de gastos levado adiante por Haddad com apoio de toda a direita golpista de 2016. Esta medida também impacta nas verbas estaduais e municipais e nas propostas de reajuste. Na vida da classe trabalhadora e da juventude, este ataque neoliberal do PT se combina com a manutenção das reformas anti-operárias, como o Novo Ensino Médio, a Reforma Trabalhista, da Previdência e a Terceirização Irrestrita. Como escreveu Danilo Paris, todo projeto de sociedade precisa de um projeto de educação que lhe corresponda. Neste sentido, o aprofundamento da precarização da educação que se dá com os cortes, com o arrocho salarial e com a manutenção do Novo Ensino Médio, corresponde também a um novo salto na precarização do trabalho, que se concretiza no PL da Uberização.

O PL da Uberização, apresentado por Lula, consiste em legalizar um aprofundamento na precarização do trabalho. Inicialmente é direcionado aos motoristas de aplicativo, mas, se aprovado, servirá como habilitador de generalizar essa forma de trabalho para outras funções. A Uberização foi um caminho encontrado pela burguesia para descarregar a crise de 2008 nas costas da classe trabalhadora, combinada ao avanço legislativo da destruição dos direitos trabalhistas. Assim, criaram-se plataformas onde, através da inteligência artificial, a localização do trabalhador seria transformada de empregado para “empreendedor”, sem chefe, autônomo e sem absolutamente nenhum direito trabalhista. O PL da Uberização, além de não garantir nenhum direito, legaliza que a jornada de trabalho seja de 12 horas diárias, 7 dias da semana, uma superexploração completa, onde se contam somente os minutos em movimento, colocando em risco o futuro da juventude. Ou seja, um ataque histórico que precisa ser enfrentado, e não defendido, como faz a Resistência-PSOL

A luta pela derrubada imediata do PL da Uberização está colocada na ordem do dia, como parte da luta contra a terceirização e a precarização do trabalho. Longe de não ter relação com as greves em curso, essa luta poderia potencializá-las, conectando a luta dos trabalhadores da educação, unindo a necessidade de enfrentar o arrocho salarial levado adiante pelo governo da Frente Ampla Lula-Alckmin, abençoado pelo seu novo Teto de Gastos, à necessidade de enfrentar a uberização que atinge e ameaça os alunos nas escolas, nos institutos federais e nas universidades. Seria um gigantesco passo se fosse convocado um dia nacional de paralisação de toda a educação, que se colocasse pelo imediato atendimento das demandas salariais, combinando sua luta com o enfrentamento ao PL da Uberização e exigindo plenos direitos aos trabalhadores de aplicativos.

Neste sentido, a CNTE chamou um dia de luta pela educação (19/03), mas não organizou em todo o país o que poderia ter sido um dia de unificar as lutas e dos educadores se organizarem, com paralisações, manifestações, inclusive em solidariedades às lutas em curso. Para realmente poder arrancar os reajustes salariais e derrotar os ataques como o PL da Uberização, assim como arrancar a revogação integral do Novo Ensino Médio e não novos acordos com a direita, é necessário que se organize desde as bases, com a convocação imediata de um dia nacional de paralisação unificada no país, com assembleias de base onde todos tenham direito a voz e voto. É mais difícil vencer com as lutas se dando separadas.

Por isso é um escândalo que a CUT, principal Central Sindical do país e que está à frente de dezenas de sindicatos em greve, assim como a CNTE, atuem mantendo as lutas isoladas e restritas às demandas salariais, sequer dando centralidade para essas greves através das suas páginas e figuras. Os parlamentares do PSOL também deveriam se posicionar em apoio a estas greves, como Guilherme Boulos que segue em silêncio frente à greve do funcionalismo em São Paulo.

O que acontece, é que ao invés de convocar a unificação das lutas, convocam no dia 23 de março um Dia Nacional de Mobilização pela Frente Povo Sem Medo e Frente Brasil Popular, onde o centro está na defesa do governo da Frente Ampla, Lula-Alckmin. Na defesa de uma democracia degradada e sem colocar na ordem do dia o enfrentamento aos ataques colocados e a necessidade de revogar os já aprovados, unificando os setores em luta. Qual democracia estas frentes, compostas pelo PT, PCdoB e PSOL, convocam a defender? Uma democracia de um regime degradado onde o bonapartismo judiciário que chancela operações da polícia federal, seu rastro de sangue e persegue greves se fortalece? Uma Frente Ampla que abraça o governador bolsonarista Tarcísio para preparar privatizações enquanto este demite metroviários, visita Netanyahu, representante do Estado genocida de Israel, e sua PM chacina o litoral? Uma democracia que compra drones de tecnologia israelense em meio ao genocídio na Palestina? Não à toa, a ruptura das relações Brasil-Israel, bem como nenhum dos ataques ou revogação das reformas consta na convocação do ato. Não seria possível lutar realmente por memória, verdade e justiça para as vítimas da Ditadura Militar e todos seus resquícios passando por alto dos ataques que estes mesmo setores apoiaram e apoiam. Se depender de Lula, não lutaremos. Novamente fica demonstrado que é justamente a conciliação com a extrema direita, que a fortalece. Este nada mais é que um ato em apoio ao governo da Frente Ampla de Lula-Alckmin, que reforça o bonapartismo judiciário e a extrema direita pela via da conciliação.

É urgente apontar um caminho de completa independência do governo, que possa de fato se enfrentar com a extrema-direita, os governos e os patrões, para arrancar os reajustes e enfrentar os ataques. Por isso nós do MRT, do Movimento Nossa Classe e da Faísca Revolucionária não pouparemos nenhum esforço em sermos parte ativa da solidariedade a cada uma das greves, atuando em defesa da auto-organização desde as bases em cada um local que estamos atuando, desde a solidariedade ativa aos técnico administrativos nas universidades federais, a cada luta de terceirizados e precarizados, ou construindo a oposição na categoria de educadores municipais de São Paulo, fomentando a unidade dos trabalhadores em luta, confiando na força da mobilização que as categorias em greve apontam, retomando métodos da classe trabalhadora e se unificando com a população, que mais sente na pele a precariedade dos serviços. Somente um caminho de independência política dos governos pode levar essas importantes greves a se massificar e a vencer, podendo ser importantes pontos de apoio para nossa classe nacionalmente e também para apontar um caminho onde os capitalistas paguem pela crise.

Por isso, não poderíamos deixar de mencionar as importantes batalhas que a classe trabalhadora e a juventude argentinas estão travando contra o presidente direitista Milei, onde já puderam fazer retroceder a Lei Ómnibus e no Senado o Decreto de Necessidade e Urgência (agora falta votação da Câmara de Deputados). O que está barrando estes ataques definitivamente não foi a conciliação, mas sim a força de uma vanguarda que resiste ao lado da esquerda trotskista que combina o combate no parlamento denunciando cada manobra política e utilizando este espaço para agitar a necessidade de responder na luta e exigindo das Centrais Sindicais uma paralisação nacional, com atuar nos locais de trabalho e estudo, nas assembleias de bairro e junto aos movimentos sociais para que surja uma alternativa desde o chão das escolas, fábricas, universidades, restaurantes públicos, e outros.




Comentários

Deixar Comentário


Destacados del día

Últimas noticias