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EDUCAÇÃO | MEC do governo Lula: Educação à serviço da iniciativa privada

Desde o início do governo Lula-Alckmin, a educação tem sido alvo de críticas de professores e estudantes que demonstram insatisfação com a manutenção do Novo Ensino Médio, que molda a educação numa perspectiva empresarial ao passo que precariza o trabalho dos educadores. A composição do MEC, no entanto, deixa claro que a perspectiva do governo não é de revogação integral de reforma alguma, e sim, de manter as bases do novo ensino médio, ou mesmo de "aperfeiçoá-las", nos marcos de manter seus fundamentos que servem aos interesses privados.

Gabriela MuellerEstudante de História da UFRGS

sexta-feira 7 de abril de 2023 | Edição do dia

Foto: Luis Fortes/MEC

A começar pelo fato escandaloso da semana passada, em pleno rechaço com a Reforma do Ensino Médio, Camilo Santana nomeou como coordenador da pasta de Ensino Médio Fernando Wirthmann Ferreira, este que assumiu o mesmo cargo durante o governo Bolsonaro, sob o MEC de Milton Ribeiro, e que implementou o Novo Ensino Médio no DF e no Brasil. Apesar da demagogia com suspensões temporárias da implementação do Novo Ensino Médio - que já foi implementado em muitas escolas e estados - o recado é claro, não haverá revogação alguma por parte do governo.

Os interesses do governo em relação à educação ficam ainda mais cristalinos quando observamos a composição do MEC, que conta com nomes comprometidos com organizações privatistas como o Todos Pela Educação, fundada em 2006, com o objetivo de estabelecer políticas e diretrizes educacionais nacionais, a partir de uma aliança entre MEC, por meio de Haddad, um liberal de carteirinha, e um conglomerado empresarial com grupos como Itaú, Gerdau, grupo Pão de Açúcar, entre outros.

Neste momento, o grupo que estava à frente do TPE era: Ana Maria Diniz (grupo Pão de Açúcar); Antônio Jacinto Matias (Grupo Itaú); Luís Norberto Paschoal (grupo DPaschoal); Milu Villela (Grupo Itaú-Unibanco); Ricardo Voltolini (Jornalista); Maria Lúcia Meirelles Reis e Priscila Fonseca Cruz, ambas ligadas ao tema de trabalho voluntário e terceiro setor. Por parte do governo federal, a participação no “Pacto” foi corroborada pela presença nas primeiras reuniões do então ministro da educação Fernando Haddad, do então Secretário de educação básica, Francisco das Chagas Fernandes, de José Henrique Paim Fernandes, presidente do FNDE na época, de Gabriel Chalita, presidente do CONSED na época e da então presidente da Undime, Maria do Pilar Lacerda. (MARTINS MOREIRA, 2013)

A continuidade da concepção liberal no MEC é clara. Camilo Santana, o ministro da Educação, foi responsável por aprofundar o modelo Sobral de educação no Ceará, o qual foi alvo de críticas de intelectuais da educação, por ser fortemente orientado a resultados em provas e avaliações, e não a uma aprendizagem real, além de se basear em princípios privatistas técnico-empresariais consoantes com os do Novo Ensino Médio. Sobral já foi chamada de “a Cingapura brasileira”, pelos gestores da Fundação Lemann por seguir um modelo educacional fortemente ligado com os interesses da iniciativa privada, com a educação sendo um dos principais alvos de investimento desse aglomerado empresarial, que é responsável lá pela capacitação de professores numa lógica bancária, profundamente liberal e privatista.

Izolda Cela, secretária-executiva do MEC, foi fortemente recomendada ao cargo pela presidência do Todos Pela Educação, e foi secretária da educação no Ceará durante o governo de Camilo Santana, tendo assumido o cargo de governadora para continuar o aprofundamento do liberal projeto Sobral. Por isso também ela mantém fortes relações com a Fundação Lemann, que formou e que tem Veveu Arruda, ex-prefeito de Sobral e esposo de Izolda, como um de seus parceiros. Maurício Holanda, secretário de Articulação do MEC, foi também braço direito de Izolda e Camilo no projeto Sobral, tendo sido secretário da educação da cidade de 2007 a 2016.

Outro nome premiado e recomendado pela Fundação Lemann é Katia Schweickardt, integrante da fundação e agora, também, secretária de Educação Básica do MEC. Ela já foi responsável pela secretaria municipal de educação de Manaus durante a prefeitura de Arthur Virgílio Neto (atualmente sem partido mas que já foi do PCB, MDB e PSDB), o qual apoiou a reeleição de Bolsonaro em 2022. Sua nomeação ao cargo no MEC gerou repulsa entre os professores manauaras. “Inimiga da educação”, nas palavras deles, ela foi contra as manifestações de professores em 2017, quando esses questionavam a política de gastos do FUNDEB, os quais foram chamados de “criminosos” por ela em uma coletiva de imprensa.

Denise Carvalho, por sua vez, ocupa o cargo de Secretaria de Educação Superior, tendo sido reitora da UFRJ, que esteve sob ameaça de fechamento por diversas vezes desde 2019 devido aos cortes orçamentários nas universidades. Como não poderia deixar de ser, Denise administrava os cortes orçamentários nos setores mais precários da universidade, racionando recursos e suspendendo contratos e serviços de terceirizadas . Além disso, em carta de despedida da UFRJ, a ex-reitora fala orgulhosamente das parcerias da universidade pública com a iniciativa privada como um de seus feitos.

“a regulamentação do compartilhamento de laboratórios da UFRJ para pessoas físicas, empresas e instituições científicas, tecnológicas e de inovação, em atendimento ao Marco Legal de CT&I; o lançamento do Conecta UFRJ, que apresenta as pesquisas produzidas pela Universidade e facilita o mapeamento das competências, possibilitando parcerias com instituições públicas e privadas.”

(carta na íntegra)

Getúlio Marques, Secretário da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica do MEC, foi responsável pela implementação do Programa de Expansão da Educação Tecnológica durante o governo Lula uma política com metas e recomendações da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco), o Banco Mundial (BM) e Banco Interamericano de desenvolvimento (BID). Essa política foi formulada desde os anos 90, com a expansão do neoliberalismo, e começou como um projeto de implementação em 2006, com o objetivo de adequar a formação de mão de obra nos países dependentes como o Brasil, de acordo com as recomendações das organizações e bancos internacionais, para a atender as demandas da divisão internacional do trabalho.

Manuel Palácios, presidente do INEP, foi integrante do MEC nos governos Lula e Dilma, e foi parte de formular e implementar a BNCC em conjunto com entidades privatistas como o Movimento Pela Base, financiado por, novamente, Fundação Lemann, Natura e Itaú Unibanco, movimento esse que também foi protagonista na formulação e implementação do Novo Ensino Médio.

Essa pequena investigação do MEC, seus integrantes e entrelaçamento profundo com a iniciativa privada busca clarificar os reais interesses do governo com a educação, que serve como uma mercadoria lucrativa para as empresas, ao passo que precariza a vida de milhares de jovens e educadores. Não é à toa que o Ministério da Educação é um dos mais conservadores do governo, conforme a análise de pesquisadores da educação. Sendo as escolas onde se produz e reproduz os valores de uma sociedade, esses são determinados pela classe dominante, que utiliza a educação como um verdadeiro aparelho de hegemonia sobre as classes subalternas, introjetando ideologia liberal com o Novo Ensino Médio para formar mão de obra precária, onde o trabalho servil dos jovens aos aplicativos é visto como empreendedorismo, e para destruir as perspectivas de trabalho dos professores com diminuição de carga horária para os cursos de humanas. Essa perspectiva desoladora da Educação com o Novo Ensino Médio, o qual o atual MEC é parte fundamental de manter, com inclusive figuras do governo Bolsonaro, está em perfeita sintonia com as reformas trabalhista, da previdência e a lei da terceirização irrestrita, os quais, combinados agora com a nova âncora fiscal, que segue comprometendo o país com o capital financeiro através do pagamento da fraudulenta dívida pública, dão o tom do novo governo.

Isso mostra que é impossível depender do governo e das instituições do Estado para batalhar pela reversão de todos os ataques e pela revogação de todas as reformas, pois seus interesses são opostos aos da classe trabalhadora e da juventude. É essencial levantar uma forte batalha pela revogação integral do Novo Ensino Médio, assim como de todas as reformas confiando apenas em nossas forças, ao contrário do que faz o PSOL, que diz ser possível "pressionar a esquerda" o governo, assumindo cargos no mesmo. Em 2017, a classe trabalhadora, em greve geral, foi capaz de barrar a reforma da previdência, os trabalhadores e jovens franceses incendeiam a França hoje contra a reforma da previdência de Macron. Esse é o caminho de organização que nossa classe precisa ter, com um movimento de trabalhadores e de estudantes independente do novo governo. Para isso, CUT, CTB, UNE e UBES precisam construir essa luta pela base, em cada local de estudo e trabalho, para que quem constrói diariamente a educação no país, em cada escola, universidade, instituto, refeitório, decida, de fato, os rumos da educação, que deve estar à serviço das maiorias, e não de um punhado de capitalistas.

MARTINS MOREIRA, Érika. Movimento Todos Pela Educação: Um Projeto de Nação Para a Educação Brasileira. 2013.




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