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Reprodução | Mulher indígena morre no parto após ter aborto legal negado no Paraná

Reproduzimos aqui, publicação feita pela antropóloga e professora universitária Débora Diniz, frente a mais um caso de morte, fruto da criminalização do aborto, até nos raros casos que ele é previsto por lei.

domingo 19 de novembro de 2023 | Edição do dia

Miriam Bandeira dos Santos tinha 35 anos. Dois filhos, indígena da reserva indígena de Mangueirinha no Paraná. A reserva é habitada pelos povos Guarani Mbya e Kaingang.

Miriam foi violentada pelo ex-marido, sofreu as barreiras do acesso ao aborto legal. Houve disputa pelo tempo gestacional da gravidez para a realização do procedimento. Ela teve medo de ser processada. Desistiu do aborto e desapareceu dos poderes que tentaram a proteger ou intimidar.

Triste e sozinha, manteve a gestação para encaminhamento de adoção. As poucas palavras de Miriam, descritas na reportagem dizem:

“extremamente abalada e fragilizada”
“não consigo me sentir mãe”
“não consigo me sentir limpa”
“não consigo amar essa criança”
“me sinto culpada, envergonhada e suja”.

Esses fragmentos da dor se Miriam são os de milhares de mulheres que sofrem violência sexual e engravidam.

Miriam não conseguiu fazer o aborto. Morreu de uma embolia pulmonar no parto. Há quem diga que não há “nexo causal” entre as barreiras enfrentadas por Miriam e sua morte no parto.

Será mesmo?
(e não faço nenhum julgamento das pessoas concretas que impuseram barreiras, desinformação ou medo à Miriam. elas são parte de uma estrutura de medo imposta pelo estado de criminalização do aborto no brasil)
(talvez não tenha nexo causal como entende o direito penal: e não quero disputar esse ponto)

Não sabemos como foi o pré-natal de Miriam. Ela estava assustada e com medo, isso sabemos. Não sabemos se estava frágil emocionalmente ou fisicamente. A fatalidade de uma embolia pulmonar se agravou com o parto, um momento de grande pressão no corpo de uma mulher. Um procedimento prévio de aborto teria exigido menos de seu corpo.

A mim, não causa estranhamento contar a história de Miriam como de morte materna POR aborto negado. O fato é que sabemos que ela morreu de um parto que não queria ter vivido, de uma gravidez imposta a ela por uma brutalidade de violência, que viveu vulnerabilidades da vida e da saúde por ser uma mulher indígena.

Miriam, uma mulher indígena, 35 anos, dois filhos, morreu pela criminalização do aborto e pela persistência do estupro contra as mulheres.

Publicação original aqui em 18/11/2023.




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