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Greve Unicamp | Lições da greve de 2023 da Unicamp: balanço da Faísca Revolucionária

Nas últimas semanas, a Unicamp foi palco de uma forte greve des estudantes por demandas fundamentais e históricas do movimento estudantil, como cotas trans e PCDs, acessibilidade para pessoas com deficiência e neurodivergentes, permanência, bandejão aos finais de semana e o Paviartes. Com mais de 30 cursos em greve, dos campi de Campinas e Limeira, e a ocupação do Instituto de Matemática, Estatística e Computação Científica (IMECC), uma luta que teve LGBTs e negres a frente. Aqui, discorreremos sobre a greve, suas conquistas e também seus entraves, como um balanço da Faísca Revolucionária sobre o conflito.

Juliana Begiatoestudante de Ciências Sociais da UNICAMP

segunda-feira 30 de outubro de 2023 | Edição do dia

1. O argumento que a reitoria escuta é a nossa luta

Com uma forte greve na USP que já ultrapassava três semanas, por contratação de professores e permanência estudantil, ao mesmo tempo em que ocorria a greve des trabalhadores da Unicamp contra o ponto eletrônico, no mesmo dia em que es trabalhadores do Metrô, CPTM e Sabesp fizeram uma greve unificada contra o projeto privatista de Tarcísio, que declarou guerra à população se apoiando no Arcabouço Fiscal do governo Lula-Alckmin, es estudantes da Unicamp também paralisaram.

Durante um dos piquetes, no primeiro período de aula, Rafael Leão, professor bolsonarista do IMECC, levantou uma faca contra um estudante negro do DCE. A partir daí, es estudantes começaram a responder de forma contundente a um ataque tão sério. Se Leão e a reitoria apostavam em colocar medo nes estudantes, a resposta que tiveram foi uma rápida massificação da luta. Nesse mesmo dia, es estudantes decidiram por greve geral em assembleia com milhares de pessoas, lutando por Fora Rafael Leão, pelas cotas trans, paviartes, bandejão aos finais de semana com mais contratações des terceirizades, contra o ponto eletrônico, e ao fim da assembleia, ocupamos o IMECC.

Uma luta, que se unificada com os setores em greve em SP e com a USP, tentando a unidade das estaduais paulistas, poderia se colocar como uma greve unificada contra o projeto privatista sem precedentes de Tarcísio, pela revogação integral do novo ensino médio, e agora poderia dar um exemplo de apoio aos trabalhadores do metrô, demitidos políticos pelo governador bolsonarista, em punição à greve. Com a força da nossa greve, arrancamos nas mesas de negociação o GT de cotas trans, PCD, os bandejões aos finais de semana e a sinalização de mais bolsas permanência. A reitoria tenta dizer que muitas coisas já estavam sendo encaminhadas, mas a verdade é que o único argumento que a reitoria escuta, é a nossa luta.

2. A greve se inicia e termina em assembleia!

A assembleia geral encaminhou um importante mecanismo de auto-organização: o comando de greve, com delegades votades nas assembleias de curso proporcionalmente ao tamanho das assembleias - o que nós da Faísca historicamente defendemos como método de organização da luta, e que por muito tempo foi rejeitado por diversos setores da esquerda. Nos dias que se seguiram, dezenas de cursos entraram em greve e elegeram seus delegades que representariam es estudantes do curso e dirigiriam a greve.

Os primeiros comandos de greve já mostraram a força da auto-organização des estudantes. Parte do DCE da Unicamp (composto por UP-Correnteza, Juntos e PCB), em especial da UP-Correnteza, fez uma tentativa de manobra burocrática contra a greve, tentando ocultar des estudantes que a reitoria havia aberto uma mesa de negociação e procurando implodir a reunião de comando. Es estudantes que compunham o comando de greve responderam de forma exemplar essa manobra, votando uma carta contra os métodos burocráticos de tal organização. Nós da Faísca demos uma batalha para que essa carta fosse publicizada, em oposição às outras organizações, como Juntos, Afronte e PCB, já que dizia respeito a uma resposta des estudantes contra um método comum às burocracias estudantis, especialmente à majoritária da UNE, PT e PCdoB, e responder a isso poderia ser um impulso para criar uma nova tradição no ME nacionalmente. Mas, infelizmente, a carta não foi publicizada devido ao papel dessas organizações.

A ocupação do IMECC foi mostrando também a capacidade des estudantes de auto-organização: limpeza, comida pelo bandejão da moras aos finais de semana, eventos artísticos, culturais, aulas abertas. Ao contrário de ser uma ocupação “violenta”, como acusou Ricardo Miranda, diretor do instituto, em suas redes, a ocupação chegou a construir uma rampa de acessibilidade em dois dias, coisa que a reitoria não assegurou em décadas.

Após arracarmos as mesas de negociação, a reitoria fez uma proposta insuficiente para nossas demandas. Foi por meio do Comando de Greve que debatemos cada ponto da carta de contraproposta à reitoria: quatro salas para o IA, moradia para Limeira, nenhuma punição aos ocupantes do IMECC, e mais contratações de terceirizades para abrir os bandejões aos finais de semana, sem nenhuma sobrecarga, além de acesso ao CECOM e às bibliotecas para esse setor, que é o mais precarizado na universidade, assim como outros pontos debatidos em comando sobre o que deveria ser apresentado.

Essa contraproposta foi levada e votada em assembleia. Foi nessa mesma assembleia geral, que as correntes do PSOL (Juntos e Afronte), UP - Correnteza e PCB, com outros setores, articularam uma manobra à greve. Foi proposta na assembleia geral que a mesa de negociação tivesse liberdade de aceitar ou rejeitar a proposta da reitoria, independente do que entrasse da nossa contraproposta. Essa manobra, que na prática tirava o direito da assembleia de decidir sobre o fim ou continuidade da greve, e o dava à mesa de negociação, significava, de forma concreta, acabar com nossa greve antes mesmo de apresentar a contraproposta à reitoria. No Comando de Greve anterior à assembleia, não foi dito por nenhuma corrente que proporiam em unidade o fim da greve, mascarado pela manobra de dar poder de deliberação à Comissão de Negociação. Nós da Faísca Revolucionária defendemos contra em meio a uma votação confusa, em que poucas pessoas compreenderam o que estava sendo votado. Não à toa, ficou claro o descontentamento de estudantes ligados ao Paviartes, à Farmácia, à Limeira e de estudantes indígenas. Defendemos naquele momento a necessidade de um comando de greve para deliberar por uma nova assembleia que refizesse a votação, o que não se concretizou.

3. Arrancamos com nossa luta o GT de cotas trans, PCD, bandejão aos finais de semana e sinalização de mais bolsas, mas a greve tinha condições de seguir e ir por mais

O entendimento da Faísca Revolucionária nesse momento, caso se colocasse abertamente a votação do fim ou não da greve e pudéssemos defender ao conjunto des estudantes nossa posição, é de que a greve deveria seguir, que a luta estava forte, que poderia se massificar, e avançar para conquistar mais pautas: Paviartes e mais contratações de terceirizadas, assim como uma formulação mais clara de não punição. Ao contrário do que teorizam as outras organizações, não achamos que a greve havia alcançado seu auge, isso pois uma série de táticas de massificação e radicalização sequer haviam sido cogitadas.

Ao longo da greve, a Faísca defendeu medidas que poderiam contribuir para massificar o movimento: um ato que saísse da Unicamp, no centro de Campinas, e expressasse ao conjunto da população nossa luta, nossas reivindicações e contradissesse as informações divulgadas pela reitoria e pela direção do IMECC; um ato festival, inspirado no exemplo da USP, que organizou o GRAVE NA GREVE, ocupando a universidade com arte, cultura, trazendo professores, intelectuais e parlamentares que apoiassem a nossa luta, para dentro da universidade, além de medidas que fortalecesse a greve dentro de cada instituto. Medidas como essas poderiam massificar a greve e fazer com que seguisse para arrancar o conjunto das pautas. Estava colocada a disputa pela opinião pública. Que a greve podia continuar, ficava claro: grande parte das assembleias de curso seguiam cheias e votavam a continuidade da greve, a ocupação do IMECC continuava com pessoas mobilizadas, organizando atividades e fazendo a ocupação funcionar. Mesmo em meio ao feriado prolongado, um número considerável de estudantes se mantiveram na Unicamp.

Essa manobra passada em assembleia não foi uma ação isolada. As direções da greve já preparavam o fim dela antes de qualquer tentativa de massificação. O discurso de correntes como Afronte, que trouxe militantes da USP para tentar acabar com a greve aqui, era de que na USP a greve havia sido derrotada e estava acabada, mas que na Unicamp poderíamos acabar com a greve antes dela ser derrotada, fortalecendo a negociação com a reitoria. Entretanto, contra a vontade de todas essas correntes, es estudantes da USP votaram contra a desmoralização que tentaram construir, impondo a continuidade da greve, apesar das posições das direções. Nós da Faisca Revolucionária defendemos a continudade da greve na USP contra a possibilidade de punições e pelas contratações. A continuidade da greve não ameaçou nenhuma das conquistas arrancadas, pois sua retirada nem sequer foi colocada pela reitoria.

Veja mais: Greve na USP segue apesar do DCE: é preciso unir os estudantes para avançar na luta

4. Nenhuma confiança na reitoria que quer dividir es estudantes e as terceirizadas

A força da nossa luta impôs para a reitoria a abertura de negociação, um importante momento da greve, que exige seguir mobilizado em prol de garantir as pautas que incendiaram a luta. Vimos que quando es estudantes ocupam, fazem greve, paralisam e lutam, arrancam suas pautas da reitoria. É essa reitoria, que deixa o curso de Artes Cênicas e Dança sem prédio há 38 anos, levando alunes a se machucarem gravemente por terem que fazer aulas em lugares totalmente inadequados, enquanto a universidade tem 2 bilhões de reais em caixa.

Na mesa de negociação, nós da Faísca ocupamos a cadeira reservada ao Comitê em Defesa das Terceirizadas. O Comitê foi fundado quando a universidade pretendia demitir 330 trabalhadoras do bandejão em 2019, e quando um terceirizado cipeiro, ao denunciar em assembleia a precarização do trabalho dentro do Restaurante Universitário, foi demitido. É nessa universidade, que faz demissões políticas, que duas terceirizadas morreram de Covid-19, Lourdes e Edvania, devido a problemas respiratórios adquiridos no trabalho, em que Cleide Aparecida Lopes morreu dentro do bandejão em Limeira, e suas colegas tiveram que limpar seu sangue e seguir trabalhando. A universidade em que a reitoria racista, que diz se orgulhar das cotas étnico-raciais, não decretou luto por Cleide, dizendo que todos os dias morrem pessoas, se mostrando totalmente conivente com a empresa Soluções que administra o bandejão da Unicamp, e agora administrao primeiro presídio privatizado do país, no Rio Grande do Sul, com parceria do governo tucano de Eduardo Leite e o governo federal de Lula.

Entretanto, foi também na Unicamp em que trabalhadoras do bandejão se colocaram contra a precarização do trabalho e das condições precárias do fornecimento de comida aos estudantes e fizeram uma greve em Limeira. Foram mulheres como Aline, Maria, Letícia, e tantas outras, todas demitidas na véspera do Natal, que se colocaram contra a precarização das suas vidas que a reitoria quer aprofundar.

Essa universidade que se diz de ponta, vira as costas todos os dias para es terceirizades. A reitoria do Tom Zé tenta dividir es estudantes e trabalhadores, porque teme essa unidade, e para isso quer conceder as reivindicações des estudantes a custo de aprofundar a precarização do trabalho das terceirizadas. E foi nesse contexto que nós do comitê ocupamos uma cadeira na mesa de negociação com a reitoria. As pautas apresentadas na mesa eram de extrema importância, cotas trans, acessibilidade e cotas PCD, prédio e contratações para o Instituto de Artes, moradia para Limeira, comida aos finais de semana, bolsa para voltar às suas casas e outras demandas des estudantes indígenas.

Em Limeira, em que o tema des terceirizades é muito caro aes estudantes, palco de demissões e da morte da Cleide, a reitoria respondeu que haverá um estudo técnico para implementar desde já as contratações, no que não podemos confiar, mas mostra que nossa luta pelas terceirizadas não é uma "pauta ilusória", como dizem organizações de esquerda.

A greve, que acabou frente a um show de burocrateada, típico da já mencionada UNE, e da sua falida oposição, saiu da última mesa de negociação em Barão Geraldo sem nenhuma resposta às terceirizadas. Os representantes do reitor, porque o Tom Zé não tem sequer coragem de debater com es estudantes, longe de serem aliades do ME como dizem setores da esquerda, na verdade são um braço da reitoria e fazem uma divisão de tarefas com a ala “reacionária” da burocracia acadêmica, que nos diz que o problema das terceirizadas é à critério do ministério público.

A reitoria é sustentada por uma estrutura de poder antidemocrática, que tem como órgão deliberativo o CONSU, em que nós estudantes, que somos maioria na universidade, temos apenas 15% de cadeiras, seguidos de 15% de trabalhadores efetivos, e 70% para professores. No CONSU, es terceirizades sequer tem voz, enquanto até a FIESP tem cadeira. É o CONSU e a estrutura de poder antidemocrática que assegura que as 600 vagas na moradia, arrancadas na greve de 2016, nunca tenham sido encaminhadas. Precisamos usar esses momentos de luta para debater profundamente quem gere a universidade, debater o estatuto da Unicamp, por uma estatuinte livre e soberana, como colocamos em meio a greve para contribuir nas discussões sobre a estrutura de poder antidemocrática e herdeira da ditadura que existe aqui.

5. Um alerta sobre os GTs

A resposta da reitoria nas mesas evidenciou que nossa luta estava forte: respondeu com GT de cotas trans e PCD, que era o programa defendido também pelo Núcleo de Consciência Trans, bandejão aos finais de semana, e sinalização de aumento das bolsas, assim como criação da bolsa moradia estúdio para famílias. Nós da Faísca, colocamos um alerta importante aos conjunto des estudantes: GT de acompanhamento do prédio do paviartes; GT des terceirizades - o qual a reitoria afirma já existir desde a morte da Cleide, afinal, qual a relevância dele na universidade; GT de acessibilidade, poderiam ser a forma que a reitoria queria encaminhar essas demandas para não se comprometer com elas até o final.

Boa parte do que a reitoria se compromete, não é cumprido. Se por um lado há GTs dos quais arrancamos conquistas, como foi o GT de cotas étnico-raciais em 2016, com a disputa pela opinião pública e mudança da correlação de forças na universidade a partir da luta dos estudantes, há GTs que a reitoria cria para aquilo que não vai conceder, como o compromisso que assumiu com as 600 vagas da moradia, que foi parte da negociação da greve de 2016 e que nunca saiu do papel. Por isso, não podemos ter nenhuma confiança na reitoria! Essa é a reitoria que persegue estudantes que se manifestaram contra a Feira Israelense na universidade. A reitoria da Unicamp quer aprofundar parcerias com as universidades do Estado sionista e assassino de Israel, que como vimos no último período é responsável pelo massacre e genocídio do povo palestino, e defende tão duramente essa parceria que coloca a polícia atrás des estudantes que barraram a Feira Israelense na universidade, em defesa de uma Palestina Livre.

6. Continuar mobilizades para arrancar cada conquista da reitoria

Se nossa visão era de que a greve poderia seguir, agora é essencial seguir mobilizades para arrancar cada GT proposto e cada sinalização da reitoria frente às nossas demandas, além de garantir que nenhum estudante seja punido.

Nenhuma confiança nessa reitoria que tenta encaminhar tudo ao CONSU, em que temos apenas 15% de representação. A universidade é sustentada por uma estrutura de poder antidemocrática. Que nossa luta sirva de impulso para debatermos todo o poder dentro da universidade, para que discutamos o estatuto que rege a Unicamp, e que coloquemos em pauta uma estatuinte livre e soberana. A universidade deveria ser gerida por um governo tripartite, com estudantes; trabalhadores - terceirizades e efetivos; e professores, de acordo com seu peso na realidade.

É essencial que as entidades, o DCE e cada CA, organizem a luta pela base, com assembleias, atos, que discutam e coloquem es estudantes nas ruas em defesa das nossas conquistas.

Nós da Faísca Revolucionária colocamos aqui nosso balanço da greve, nossa perspectiva de aposta na auto organização des estudantes, contra todos os tipos de manobras e métodos burocráticos das direções. Apostamos na aliança operária-estudantil, ao lado des terceirizades, pela efetivação sem concurso público. Nossa luta precisa ser independente da reitoria e dos governos, se a reitoria quer nos dividir, lutemos em unidade. Venha conhecer e se organizar na Faísca Revolucionária, por uma universidade a serviço da classe trabalhadora e dos setores oprimidos.




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